Ainda mais reconhecido como o enólogo da Quinta do Portal, o “vigneron” do Douro mostra que os vinhos a “solo” são muito especiais e vieram para ficar entre os grandes pequenos projetos biológicos da região.
Visitar as vinhas e falar do Douro com Paulo Coutinho revela que este talentoso profissional domina e venera a região onde nasceu, cresceu e venceu como enólogo da Quinta do Portal. Desde 1994 está ao leme desta clássica marca duriense, onde desenvolveu uma série de produtos e ganhou imensa experiência na elaboração de vinhos de mesa, mas também de Porto e Moscatel, estes últimos, diga-se de passagem, diferenciados e excelentes. No seio da Quinta do Portal, alimentou o seu plano de um projeto pessoal. Uma proposta trazia muitas benesses à outra, com o seu campo de ensaios nas parcelas próprias a trazer novas ideias e energia ao Portal, e a pesquisa, técnicas e tecnologias empregadas numa marca de respeito, com 700 mil garrafas de produção anual, a aportar maturidade e sabedoria para a sua assinatura pessoal.
Concluiu a Licenciatura em Enologia na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro em 1993, mas no ano anterior já havia começado a reestruturar uma parcela com o pai, a Vinha da Fonte, na aldeia de Celeirós, adquirida por Paulo em 2006. Esse anfiteatro xistoso, entre os 400 e 500 metros de altitude, com exposição sul-sudeste, foi o palco de muitas das experimentações de Paulo Coutinho no caminho para a excelência. Reconversão de castas, criação de taludes, troca de sistemas de poda e condução, conversão orgânica a partir de 2012 e, agora, alguns preceitos de biodinâmica, trouxeram conhecimento e qualidade aos vinhos assinados pelo enólogo, em todos os projetos.
Essa belíssima vinha de 0,8 hectares, circundada por olivais e árvores de fruto, algumas delas mesmo dentro dos taludes, traz uma incontestável sensação de ambiente vivo e vibrante. Muitas plantas aromáticas foram ali plantadas nos últimos anos para reforçar a biodiversidade. Da Vinha da Fonte provêm as uvas que compõem os tintos de Paulo Coutinho, plantadas em “field blend” com as castas Touriga Franca, Tinta Barroca, Tinta Roriz e Touriga Nacional, e mais 10 a 15% de outras variedades, entre elas a Tinta Amarela.
Ao caminhar com Paulo pela vinha tem-se a impressão que conhece cada planta individualmente. Não esconde a paixão pela vinha e por tudo o que ela significou na sua vida familiar e profissional. Encanta-se com o potencial da Tinta Roriz ali, trabalhada com baixos rendimentos de 1 a 1,2 kg./planta, “que oferece uma fruta fantástica aqui no vale do rio Pinhão, menos vegetal que no vale do rio Douro”.
A pouco menos de 10km, em São Martinho de Anta, terra de Miguel Torga, um dos mais influentes poetas e escritores portugueses do século XX, Paulo Coutinho encontrou a vinha para produzir brancos do mesmo nível de qualidade que os tintos. A Vinha do Borrajo, de 1,8 hectares foi adquirida e plantada em 2016, numa zona dominada por outras vinhas, pinhais, soutos e pomares. Aqui, literalmente tropeçamos em pedras de granito, para além de xisto e quartzo. A altitude de 600 metros faz-se sentir com um sopro constante e gélido e a cobertura vegetal entre as filas de vinha, estavam com um manto branco de gelo, numa fria manhã de janeiro. A biodiversidade é questão séria para Paulo e as estratégias do cultivo biológico ou biodinâmico são usadas aqui também, o mais sensato em cada ano: “Não tenho amarras filosóficas”, diz o experiente homem de vinha e de adega. As castas predominantes na Vinha do Borrajo são o Gouveio, o Viosinho e o Encruzado, distribuídas em três talhões, sendo que um potente Viosinho dá o seu melhor na parte mais xistosa, e um Encruzado muito tenso e mineral, nos afloramentos mais graníticos. Uma outra parcela foi plantada ao lado do Borrajo, a Vinha da Costeira, onde novas experiências de maior densidade e um “field blend” de brancas durienses trarão novas dimensões aos seus vinhos desta cor.
Provamos os vinhos prontos e também nas barricas, na espetacular adega do arquiteto Siza Vieira na Quinta do Portal.
Provamos diversos ensaios de brancos impressionantes, entre o que o Douro faz de melhor nesta tipologia, vinhos soberbos e cheios de “fator drama”. Os tintos já estão num estágio menos experimental e encantam pela tremenda elegância. Com a sua expertise técnica e vinhedos de grande potencial tratados como um jardim - a vindima é feita em “tries”, como fruta de pomar, em se que colhe apenas as maduras de cada vez - os vinhos que levam a cara e a assinatura do Paulo Coutinho no rótulo assumem definitivamente uma posição de destaque entre o que há de melhor no Douro dos verdadeiros “vignerons”. Para além dos vinhos aqui publicados, foi ainda provado o tinto Paulo Coutinho 2016, pontuado na edição 365, com 17,5 valores.