Santa Vitória

O vinho no campo e enoturismo

Fotografia: Fabrice Demoulin
Manuel Moreira

Manuel Moreira

“A propriedade vai até onde a vista alcança!”, dizem-nos numa pequena elevação que permite olhar ao redor, em 360º. E sentimos dificuldade em observar onde ficam os limites da propriedade. Santa Vitória emerge do acumulado de cinco herdades adquiridas no final da década de 90 do século XX, totalizando 1640 hectares.
 
 

A Casa Santa Vitória é uma empresa do grupo Vila Galé que produz vinhos e azeites alentejanos, fundada em 2002 e, “fruto de uma paixão pelas vinhas e olival da terra que a fez nascer, desde o início pretende colher e criar com paixão e rigor o que de melhor se produz no Alentejo”. Ao percorrer os corredores interiores da herdade vemos a vinha posta em suaves ondulações, orientadas em todos os pontos cardeais. Abeirando-nos de uma dessas encostas, dizem-nos ser a preferida dos enólogos, a qual imaginamos ser a destinada aos vinhos de topo da Santa Vitória. Só de vinha são 130 hectares. Os vinhos da Santa Vitória são produzidos a partir de três vinhas: a Vinha da Encosta, Vinha de Albernôa e Vinha da Juliana. A plantação da vinha teve início no ano 2000, toda ela situada ao redor da adega, permitindo que as uvas cheguem rapidamente sem sofrer alterações durante o percurso. 

Acompanha-nos Tomás Jónatas, diretor industrial da Santa Vitória, que supervisiona toda a vertente agrícola, viticultura incluída, assim como o olival e o lagar de azeite. Num desses locais, dos tais que a vista não alcança, somos informados da instalação de uma vinha em regime de produção biológico. Das parcelas de vinha e por entre os pomares, de pera rocha, de ameixas, de nectarinas e pêssegos, acaricia-nos uma leve brisa mesmo em hora de pico de sol. Algo já percebido e comentado no dia anterior, em hora mais adiantada. Estando em tão quente e interior área do país, esta aragem com certeza terá vários efeitos, acreditamos, benéficos, em especial para a vinha, seja no que respeita ao equilíbrio de maturações da fruta e no mitigar de incidência de certas doenças criptogâmicas. 

Na visita à adega, agora tendo por companhia a enóloga Patrícia Peixoto, responsável por toda a enologia de Santa Vitória, constatamos algo que no íntimo foi sentido nas vinhas, e por toda a propriedade, mas que na adega é visualmente mais impactante, ou seja, a limpeza e organização da adega. Detemo-nos numa área específica da adega, destinada à vinificação dos vinhos topo de gama, a chamada “linha especial” com destaque à plataforma por cima de determinadas cubas, automática, que privilegia a as operações por gravidade em detrimento das bombagens mais agressivas. Para esses vinhos ditos “especiais”, um lagar para pisa a pé é, também, usado. Lagar que é, simultaneamente, muito procurado no que diz respeito a experiência de enoturismo em época de vindimas. No piso inferior, destaque para a sala climatizada de fermentação em barricas, cave de estágio de vinho em barricas, que rondam as 300 barricas e zona de estágio em garrafa. A organização da adega, os circuitos muito bem definidos, entre outros detalhes, sente-se tudo próprio de um projeto que tem na oferta de enoturismo segmento importante e que cruza igualmente hotelaria e o vinho. 

A produção ronda o milhão de litros, apesar de a adega ter capacidade para o dobro, permitindo alguma prestação de serviços de enologia a terceiros. Deste valor global, o vinho branco corresponde a “280 mil litros, sensivelmente; já o vinho rosé é produzido em função das solicitações do departamento comercial e marketing”, refere Patrícia Peixoto, encontrando-se este último em trajetória ascendente na quantidade de produção. 

A decisão pesa bastante em função das necessidades do grupo Vila Galé, que absorve cerca de 30% da produção. Com este peso todo por parte da hotelaria e os efeitos da pandemia a implicarem restrição à atividade hoteleira em 2020, o impacto negativo no escoamento e venda de vinho e respetiva acumulação de stocks foi significativo. Uma das soluções para amenizar o impacto e rodar stocks foi recorrer a uma solução já existente, mas que tinha um peso residual nas vendas - a loja online. Profissionalizou-se o canal online, com campanhas e ações mais “agressivas”, mais uma vez interligando vinho e hotelaria, resultando que em quatro meses, venderam mais no online do que em 5 ou 6 anos. Com esta solução foram sendo criados esquemas de incentivos ao staff e programas de fidelização aos clientes online e Vila Galé. 

 

A originalidade do enoturismo

Mais recentemente, e ainda em fase derradeira de preparação para ser implementado muito em breve, em 2021, surgem duas propostas mais elaboradas, resultam do facto de terem clientes muitos fiéis, que “todos os anos vão aos nossos hotéis pelas mais variadas razões, e porque não Santa Vitória, tirar partido já que as pessoas compram”, diz Sara Meneses, do departamento de marketing, referindo-se às compras regulares feitas nas montras de produtos existentes em todos os hotéis do grupo. 

Visando potenciar a fidelização e valorização dos produtos premium de Santa Vitória e Val Moreira (projeto do Douro), “as pessoas poderão adquirir uma quantidade mínima de garrafas, e Santa Vitória ou Val Moreira oferece um rótulo personalizado e o número de garrafa”, esclarece Sara, com este pack a ter o nome de Reserva Especial. A outra proposta é mais ambiciosa: chama-se Projeto Barrica, “em que o cliente pode comprar uma barrica dos vinhos topo de gama, o Inevitável da Santa Vitória e o Reserva do projeto do Douro”, explica Sara. A aquisição da barrica engoba “estadia no enoturismo, passeios pelas vinhas, pisa a pé (da uva que irá para a barrica adquirida), um curso de enologia com os enólogos, jantar de apresentação aquando do vinho pronto, para explicação. Assim como uma experiência na adega em plena vindima”, completa Sara. Todo o projeto está já em fase derradeira para entrar em comercialização, e operacional para ter início já na vindima de 2021. A experiência Projeto Barrica terá um custo que rondará 2200 euros para o vinho alentejano e 2800 euros para o vinho do Douro. Detalhes definitivos surgirão aquando da efetiva comercialização da experiência. 

Oportunidade para conhecer e provar os novos lançamentos de Santa Vitória da gama Seleção, o Santa Vitória Seleção branco 2020, feito com Arinto e Verdelho, e o Santa Vitória Seleção Rosé 2020 elaborado integralmente com Alfrocheiro, assim como o espumante Santa Vitória Brut Natural 2018, este elaborado com Arinto e Baga, que permaneceu com as borras da segunda fermentação por 18 meses. Como posicionamento, a gama Seleção situa-se logo a seguir à gama de entrada, Versátil, por norma uma combinação de duas castas, submetidas a alguma bâtonnage em inox. Acima, situam-se as gamas Reserva, Grande Reserva, o Touriga Nacional (como único vinho monocasta de Santa Vitória) e o Inevitável, o topo de gama. Como perspetiva geral, os vinhos Santa Vitória apresentam uma finesse e frescura menos expectável quando se considera a sua localização, mas é um facto cada vez mais constante e patente nas provas efetuadas. Nas gamas superiores, através de variadas provas verticais, os vinhos têm demonstrado excelente aptidão de guarda. Pressente-se pelo trajeto até à atualidade, uma consistência crescente na qualidade, num desenho cada vez mais elegante e preciso.


Os azeites Santa Vitória

 

A visita guiada incluiu o lagar de azeite da Santa Vitória, em funcionamento desde outubro de 2019, para potenciar a máxima qualidade dos azeites Santa Vitória. Tomás Jonatas foi desvendando alguns dos detalhes da produção e processo, do olival ao produto final. É um lagar com capacidade de transformar cinco milhões de quilos mas, segundo Tomás, “a produção total do lagar Santa Vitória ronda os 2 milhões, com margem para prestação de serviços para terceiros”. Parecem números gigantescos, mas na verdade, e segundo o nosso cicerone, esta dimensão não passa de um pequeno operador quando comparado com outros do sector. No interior não dá para não destacar a imaculada higiene das instalações, pois “o azeite tem uma característica tipo esponja em que agarra todos os cheiros, por isso no protoloco operacional existe uma higienização do lagar 3 vezes por dia. Nas várias receções de azeitona, por cada mudança de variedade que entra no lagar”, detalha Tomás. Fazem seleção por calibre de azeitona e separação das sete variedades com as quais trabalha Santa Vitória. “A grande chave para produzir azeite de qualidade é a rapidez do processo da colheita até à sua extração e trabalhar o mais rápido possível”, sublinha Tomás. É ideal que todo o processo não ultrapasse as 12 horas mas, “na Santa Vitória, esse tempo é reduzido a cinco horas!” Todos os seus azeites são produzidos por processos mecânicos e por extração a frio - extrair a um máximo de 26ºC – e no máximo aproveitam 15% a 20% da melhor gordura da azeitona. Ocasião para degustar a gama de azeites da Santa Vitória e aprender a provar azeite, no qual se destacou um destaque um azeite 100% Cobrançosa, de notas verdes, muito fresco de aromas, sugestões a folha de oliveira, relva, com delicioso picante e amargo final, que mereceram de Tomás as palavras “grande parte dos consumidores não consegue aceitar que o azeite possa ser amargo e picante”. Acrescenta que os portugueses “privilegiam os azeites maduros, em detrimento dos verdes” (de aromas mais verdes). 

Casa Santa Vitória
Herdade da Malhada, Albernôa 
7800-730 Santa Vitória
T. 284970170
E. info@santavitoria.pt