Quinta de S. José - O Douro moderno

Fotografia: Daniel Luciano
Luís Costa

Luís Costa

O que leva um casal como João Brito e Cunha, um dos nomes grandes da enologia duriense contemporânea, e a sua mulher Sofia Prazeres, que durante anos foi a crónica campeã nacional de ténis, a optarem por viver no Douro profundo, relativamente isolados, numa quinta bem lá em baixo junto à margem esquerda do rio, em domínios de Ervedosa? Seguramente um projeto de vida e uma paixão imensa e inquestionável por aquelas terras, pela atividade agrícola, pelo mundo do vinho, pelo enoturismo.

 

É precisamente na sua Quinta de S. José, paredes-meias com a Quinta de Roriz (dos Symington), que encontramos João Brito e Cunha e Sofia Prazeres, depois de serpentearmos uma estrada típica de “vinhas de montanha” – mas em excelente estado de conservação – que passa pela Quinta da Gricha (dos vinhos Churchill’s) sensivelmente a meio da descida rumo às águas silenciosas do Douro.

Aqui chegados, vemos um interessante conjunto de três casas de xisto exemplarmente integradas na paisagem, uma piscina de águas retemperadoras e uma novíssima loja de vinhos, com sala de provas sobrelevada, muito funcional e bem desenhada. Percebe-se, logo ali, que a Quinta de S. José não é apenas um produtor de referência dos melhores que o Douro tem – como é hoje cada vez mais justo e imperioso reconhecer –, mas é também um interessante projeto enoturístico, com possibilidade de fácil acesso por barco e transbordo no Pinhão, honrando desse modo a matriz original do projeto idealizado pelo pai de João Brito e Cunha em finais dos anos 90.
Foi mais precisamente em 1999 que Ruy Brito e Cunha, antigo administrador da Quinta do Vesúvio que trataria da venda respetiva à família Symington, vislumbrou o potencial turístico das casas de S. José então em ruínas. E foi prioritariamente movido pela aposta no turismo, quando ninguém, ou quase ninguém, pensava nisso pelos confins durienses, que Ruy Brito e Cunha partiu para a aquisição desta Quinta de S. José, assim abrindo caminho a uma aposta depois continuada – e aprofundada – pelo seu filho João a partir de 2005 (quando adquiriu a vinha e a marca Quinta de S. José aos seus familiares) e, meia dúzia de anos volvidos, quando o casal João e Sofia apostou também na componente turística desta propriedade que faz parte da área classificada pela UNESCO como Património Mundial da Humanidade.

Mas João Brito e Cunha é um homem com o apelo da terra, do Douro e do vinho, ou não fosse ele descendente de D. Antónia Adelaide Ferreira, a Ferreirinha. Habituado aos socalcos durienses desde criança, quando calcorreava a Quinta do Vesúvio administrada pelo seu pai, é um dos muitos enólogos formados na UTAD que protagonizaram a revolução do vinho em Portugal na década de 90 do século findo. Depois de passagens por França e pela Austrália, João Vasconcelos de Brito e Cunha fixa-se no Douro para dar o seu contributo aos primeiros anos do projeto Lavradores de Feitoria. Entre outras consultorias, de que ainda mantém hoje quatro ou cinco, começa a orientar o seu foco para o projeto familiar que haveria de tornar-se pessoal, seu e da sua mulher Sofia, logo a partir de meados da década passada.

Um momento determinante ocorreu em 2012, quando João viu um projeto para a Quinta de S. José aprovado em plena crise financeira. “Foi então que comprámos um terreno na parte de cima da quinta, logo à entrada, e avançámos para a construção de uma adega própria”, conta-nos o próprio João Brito e Cunha, que até então sempre fizera os seus vinhos na Quinta da Touriga Chã, do seu especial amigo Jorge Rosas.

Terras de xisto com vestígios de minério

Na conversa com a Revista de Vinhos, João Brito e Cunha evoca a (relativamente) rápida evolução do seu projeto de vida, ao mesmo tempo que o caracteriza sumariamente: “Quando comprámos a quinta, ela nem sequer tinha três hectares de vinha. Fomos aumentando gradualmente a área e fazendo sucessivas plantações, de tal forma que hoje temos 11 hectares, tudo letra A. Em termos de encepamento, temos Touriga Nacional, Touriga Franca, um bocadinho de Sousão, e no ano passado plantámos um bocadinho de branco, da casta Gouveio, na parte superior da quinta. Mas é uma curiosidade, apenas para vermos no que dá, pois os brancos que fazemos – desde quando eu fazia o Ázeo – são de uvas provenientes da zona de Meda e também de Murça. Entretanto, recentemente arrendámos quatro hectares de vinha mesmo aqui ao lado, vinhas com o perfil da Quinta de S. José”.

A seu lado, Sofia Prazeres detalha-nos um pouco a dimensão enoturística do projeto: “Temos três casas: a casa azul, a cada rosa (a maior de todas) e a casa verde. Todas elas têm duas “suites”, uma pequena sala e uma “kitchenette”. Mas nós também serviços refeições mediante reserva prévia. E estimulamos quem nos visita a vir de barco, a partir do Pinhão, pois o acesso é mais cómodo e mais rápido”.

De algum modo, este é o “ano zero” do projeto enoturístico de João e Sofia. Anteriormente, tinham as casas em regime de contrato de exploração, mas “este ano – como nos explica João – comprámos a parte das casas, e por isso dizemos que é o ano da estreia debaixo da nossa completa e total jurisdição”.
Voltando ao mundo dos vinhos e às características peculiares da Quinta de S. José, com as suas vinhas voltadas a Norte, o que dá especial frescura aos vinhos aqui produzidos – sobretudo em anos particularmente quentes no Douro –, há um outro elemento do “terroir” da Quinta de S. José que lhe confere especial singularidade: as antigas minas de estanho que aqui existiram, mas também de volfrâmio, o que é visível e notório no xisto espalhado pelas vinhas, muito dele misturado com vestígios de minério.

Como enóloga residente a ajudá-lo no dia-a-dia da Quinta de S. José, João Brito e Cunha conta com a colaboração de Andreia Alexandre, que apesar da sua juventude já tem uma experiência de sete anos na região francesa da Provence. O que nos levou a questionar Brito e Cunha sobre a possibilidade de a Quinta de S. José vir a integrar no seu portefólio um rosé de grande nível, à semelhança dos melhores do mundo que são feitos na Provence, precisamente. E se a resposta não foi assertiva, o sorriso de quem respondeu “quem sabe, quem sabe” faz-nos supor que, mais cedo ou mais tarde, vamos ter um rosé Quinta de S. José.

Até lá, podemos deliciar-nos com os outros excelentes vinhos concebidos e produzidos por este dotado enólogo e produtor descendente da Ferreirinha. O que não é novidade, como sabemos, pois já em 2009 – há quase dez anos, portanto – a conceituada jornalista inglesa Sarah Ahmed escolheu o Reserva 2007 da Quinta de S. José como um dos 50 melhores vinhos portugueses do ano.

QUINTA DE S. JOSÉ                                                                          
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